Outra forma histórica e cheia de mistérios utilizada por bruxas para voar entre os mundos é o unguento do sabá, também chamado de unguento de voo, ceia negra ou bálsamo das bruxas. Esse composto especial era feito a partir de plantas reconhecidamente alucinógenas, algumas venenosas ao ponto de matar, mas balanceadas como somente um químico de hoje faria, transformando veneno em remédio para a alma.

Existe uma longa relação entre veneno e bruxaria. Veneno é tanto uma palavra quanto uma imagem, um signo que demonstra perfeitamente o equilíbrio entre cura e dano, representando o caminho tortuoso da feitiçaria e a “amoralidade” que o acompanha. Existem venenos que se bem utilizados, curam; do mesmo modo, a dose errada pode certamente causará muita dor e até morte. O que faz o remédio? A dose. Como a bruxaria, o veneno quando diluído perde seu toque e sua eficácia.

O veneno é gerado por plantas que desejam se defender de predadores, do contrário, a planta seria devorada e não se proliferaria. Da mesma forma, devemos ser como plantas venenosas, capazes de se proteger da malevolência que se esconde em nosso mundo. Muito de qualquer extremo pode levar à sua destruição como bruxa ou fazer com que você perca a conexão com sua Arte. Quanto mais veneno em sua vida, mais você corre o risco de se matar.

É dessa forma que a natureza funciona. Não se pergunta a uma planta venenosa por qual motivo ela mata ou cura, ela simplesmente funciona assim. Quando forçamos o caminho a um extremo acabamos por destruir o que ele de fato é, destruímos sua essência. Então se a bruxaria é o veneno, nós somos os envenenadores.

Infelizmente, nos dias de hoje, o desejo de pesquisar e aprender sobre a natureza está cada vez mais escassos entre nossos prospectivos bruxos e bruxas, que se distanciam, por puro preconceito, das plantas venenosas e alucinógenas, uma vez que não as veem como um modo válido de alcançar outros estados de consciência. Uma atitude incorreta e desrespeitosa, uma vez que bruxas em diferentes países, culturas, credos e épocas têm consumido de diferentes formas todos os tipos de misturas como auxiliares para entrar em estados de transe. Seja álcool, cigarros, drogas ou plantas, é útil pelo menos ter uma visão mais ampla e aberta do que somente o conhecimento popular sobre medicamentos de farmácia, drogas que são liberadas pela sociedade em que vivemos. Por exemplo, um incenso não é uma droga, mas em alguns países do Oriente Médio tê-los em casa pode ser motivo de cadeia por ser um item de bruxaria, já em outros países, a fumaça de um incenso pode render uma multa se utilizado em apartamento, uma vez que as regras antitabagistas se aplicam sobre o uso de incenso nessas outras localidades.

Quando falamos de uso de ervas de poder para o transe, não estamos falando de se divertir somente, sua mente precisa de um foco ritual. Uma vez que trabalhamos com espíritos, devemos evitar o uso de drogas para recreação, uma vez que podemos acabar entrelaçados por seus espíritos, como o do tabaco, cujo espírito é invejoso e costuma gostar de ser adorado por seus utilizadores, mas que é uma das mais poderosas oferendas aos deuses. Quando aprendemos o uso dessas substâncias de poder, somos guiados por alguém que já tenha feito a jornada de modo a nos direcionar, orientando nossa percepção enquanto no outro lado. Então, como você pode observar, vale a pena ser cauteloso, independente da natureza da planta. É muito fácil tropeçar ou ser enganado quando se trata de ervas de poder.

Eis uma lista de compostos históricos utilizados por bruxas:

Trata-se de um composto de ervas narcóticas que causam o chamado “voo da alma”. É o mais famoso e misterioso composto criado pelas bruxas. Com ele a bruxa é capaz de transcender o plano físico. Feito com ervas que causavam a sensação de levitação, como a datura, a belladonna, a mandrágora e o heléboro negro. Para criar uma Pomada Voadora tradicional, deve-se não só compreender totalmente o espírito das plantas utilizadas e as dosagens ou contra-indicações “seguras”, e se for feita para ser compartilhada com outras pessoas, assumir a responsabilidade e a obrigação de seu uso. Essas plantas são poderosas e exigem respeito.

Este é um nome dado aos cogumelos utilizados pela bruxa para transcender a experiência física. Literalmente, ao comê-los, nos tornamos um com o mundo e expandimos a percepção humana. O mais famoso é o Agaricus, o famoso cogumelo vermelho com manchas brancas, geralmente desenhado junto de fadas e duendes, o que é um sinal de que a aparência não significa, necessariamente, que algo é bom ou mau, afinal esse pequeno cogumelo e outros, são espíritos poderosos, perigosos e se tratá-los sem o devido respeito, eles devorarão você em todos os sentidos. Como deuses encarnados, os poderes dos cogumelos são vastos, como tem provado a ciência, que hoje utiliza a psilocibina para combater diversos malefícios, até mesmo a depressão.

Esse composto é mais complexo, uma vez que seus nomes podem indicar coisas distintas. No Brasil, a Jurema é uma das plantas de interesse da bruxa, uma vez que ela abre a porta do espírito para ele subir a árvore dos mundos e viajar entre os muitos reinos distribuídos pelo nosso território. Para a pajelança a Ayahuasca é quem abre essa porta, possibilitando experiências extra sensoriais que permitem acesso a diversas realidades e ensinamentos. Apesar de nenhum desses dois ser um vinho de uva, assim são chamados pois a ideia de vinho, por si só, pressupõe algo que pode turvar a mente, como acontece com as pessoas embriagadas. Curiosamente, Dioniso, o deus grego do vinho, porta uma taça da qual quem bebe é tomado de êxtase e loucura. “Eu sou a videira”, diz ele, nos oferecendo visões sobre a morte e a vida, sobre momentos de desespero e de alegria. O ‘vinum sabbati’, nesse sentido, é cognato do unguento de voo da bruxa.

A relação das bruxas com plantas em geral é extensa e profunda, indo desde as poções ou filtros, os incensos, os chás e bebidas, até uma profunda relação com o mundo espiritual vegetal, cultivado cuidadosamente através de gerações de famílias que transmitiram essa sabedoria verde até os dias de hoje. Como segredos sussurrados ao pé do ouvido, essas pessoas ouviram o espírito do aliado verde falar sobre suas maravilhas e permitiram que eles moldassem nossos espíritos quando consumiram de seus brotos, passando então a compartilhar esses saberes com aqueles que vinham adiante no caminho.

A lista a seguir é uma lista de poderosos aliados que revelam saberes profundos que não podem ser descritos através da linguagem humana. Por serem poderosos, demandam muita experiência antes de podermos trabalhar com eles, mas são importantes para a bruxa conhecê-los e entender o por que as bruxas do passado utilizaram deles em suas práticas e rituais. Eles são espíritos complexos e demandam sacrifícios para que os verdadeiros mistérios que eles guardam sejam revelados.

O trabalho a seguir pode ser feito com qualquer tipo de planta, incluindo as plantas de poder. Antes de fazê-lo, é necessário que você tenha já uma longa pesquisa sobre a planta, de modo a entender tudo e mais um pouco sobre ela. Esse é um passo muito importante e não deve ser pulado. O motivo disso é para que você possa saber bem o que está fazendo e por que você fará isso, pois ao fazê-lo, você irá assumir a responsabilidade de trabalhar com outro ser, e seja humano ou não, você deverá manter uma rotina para que isso funcione. Outro motivo de se pesquisar muito antes de começar esse tipo de trabalho é para que a planta possa se manifestar caso não deseje trabalhar com você, isso pode ocorrer através de sonhos ou mesmo sinais em sua vida cotidiana, caberá a você interpretá-los.

O primeiro passo, desse modo, é reconhecer a planta pelo que ela é, um poderoso enteógeno, capaz de matar ou curar. Apesar de sua forma pequena e frágil, os enteógenos não são fofinhos nem bonitinhos, eles são poderosos. Comece reconhecendo e respeitando este aspecto da planta e ela irá lhe ensinar exatamente o que fazer para “voar” com a ajuda dela. Qual é o poder dessa planta? Ela é ctonica? Iluminadora? É importante ter em mente essas perguntas uma vez que quem irá controlar as primeiras viagens é o espírito da planta. Por exemplo, os cogumelos são telúricos, são ligados por imensas teias abaixo dos nossos pés e são ótimos para trabalhar as coisas interiores, que jazem ocultas ou que estão distantes. Já a cannabis, possui um espírito ígneo, ligado ao fogo, causando euforia, o que a torna ideal para manifestar a sabedoria sussurrada pelos espíritos.

Não é suficiente, mas desejo ressaltar mais uma vez, o uso de ervas de poder pela bruxa não é o mesmo que se divertir com drogas. Utilizar ervas de poder com propósitos mundanos pode ser prejudicial para sua relação com a planta e com seu corpo.

Depois de pesquisar, então você deverá cultivar a planta e conversar com ela todos os dias, e esse é o momento em que grande parte dos relacionamentos dos humanos costuma falhar. Cultivar e nutrir qualquer coisa exige querer, saber, ousar e calar, por isso é importante que você já tenha em mente tudo o que for necessário para começar sua jornada com a planta, sabendo desde como cultivar quanto a como nutrir para mantê-la sempre viva.

É importante que você perca sua importância ao falar com as plantas. Muitas pessoas costumam falar sussurrando com as plantas, com medo de serem taxadas de loucas, mas o fato é que ao fazer isso você está se bloqueando de reconhecer o enteógeno como um poder, colocando muita importância na aparência que você tem para os outros. Lembre-se que uma bruxa não deve ter medo de ser quem ela é uma vez que ela é o maior poder vivo na terra, todo o resto é mera aparência.

Uma vez que tenha cultivado sua planta, com a primeira poda, você poderá começar a congregar com o espírito da planta de forma mais direta. Você poderá utilizar os galhos ou folhas da primeira poda para realizar um ritual chamando o espírito da planta, depois coloque-os abaixo da sua cama e vá dormir, anote tudo. Lembre-se, não consuma a planta até que tenha certeza que ela deseja trabalhar com você.

Assim que tiver certeza que os caminhos estão abertos para trabalhar com a planta, então realize um trabalho de transe mais profundo, consumindo uma minúscula parte da planta. Ao realizar este trabalho seu foco será em aprender como se comunicar com a planta e descobrir qual o sigilo para conjurá-la. Essa etapa pode levar anos, mas é gratificante quando recebemos a cada sessão informações que são úteis para nosso trabalho.

Com todos esses passos você terá iniciado um relacionamento com a planta e a essa altura poderá ter já manifestado saberes derivados desses encontros com o espírito da planta. Agora você é responsável por manter um bom uso desse saber, devendo repassá-lo somente a aqueles que partilhem da mesma admiração que você tem pelo espírito da planta, e evitar que ela caia em mãos profanas, que irão usá-la somente para se divertir.

MICHAEL NEFER
(Trecho do livro ‘Liber Umbrae’)

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